OPINIÃO | Carlos Abrantes | A Coreia do Norte é fixe
Quando disse aos meus amigos que ia de férias para a Coreia do Norte a reacção não se fez esperar. Para a Coreia do Norte? Tens a certeza que queres ir para a Coreia do Norte? E ficavam a olhar para mim com aquele ar compadecido de quem acha que eu tinha perdido o tino. Com tantos destinos de sol e mar, com Mediterrâneo e Caraíbas, com Brasil e Tailândia eu escolhera a Coreia do Kim Jong-Un, Mr. Rocket Man!
E foi uma óptima escolha.
Aconselho aos ambientalistas do PAN, tão na moda, e aos amantes das grandes causas politicamente correctas, uma estadia naquele paraíso ambiental. Não sofrerão com os engarrafamentos das grandes metrópoles capitalistas porque em Pyongyang, a capital, praticamente não circulam automóveis, nem camiões, nem autocarros. Emissões de carbono zero, ou quase.
Em contrapartida vê-se muita gente a pé, a caminho do trabalho ou de lado nenhum, promovendo um estilo de vida saudável, sem complicações cardiovasculares ou de diabetes. À excepção do “querido líder”, não vi gordos. Uma vitória do povo norte coreano que, desse modo, pode dispensar a existência de serviço nacional de saúde.
Também o regime alimentar muito frugal, pobre em hidratos de carbono, proteínas, gorduras e açúcares, com consumo de carnes vermelhas zero, é um exemplo para o mundo. Daí que seja seguido de perto pela comunidade científica, nomeadamente pela Universidade de Coimbra que, numa atitude pioneira e esclarecida decretou a proibição do consumo de carne de bovino nas cantinas estudantis.
Há, no entanto, um “mas” que perturbará os nossos amigos do PAN. Os Norte coreanos gostam, e consomem, carne de cão. Em ocasiões especiais, é certo, mas comem cão. Sopa de cão, cão guisado, cão frito, mil maneiras de cozinhar cão... Tal como o PAN eles também gostam de animais. Têm uma forma diferente de gostar, mas que gostam, gostam!
E gostam também dos líderes. Não os comem, porque não podem, mas têm um carinho especial pelos líderes. Erguem-lhes estátuas monumentais. Aos três – ao avô, ao pai e ao filho. Uma democracia, nas palavras de Bernardino Soares, transmissível de pais para filhos.
É tudo em grande! São enormes as estátuas, os cemitérios, os edifícios públicos, as bibliotecas, os museus, ou os estádios. E os espectáculos e as manifestações populares de apoio, ou de pesar. E as auto-estradas, ah as auto-estradas! Com três pistas em cada sentido, viajei a partir de Pyongyang para sul até ao paralelo 38 e para norte até Myohyang. Um espanto! Sem portagens nem congestionamentos, sem aselhas nem chico-espertos. Centenas de quilómetros sem um sobressalto ou um acidente. Havia, é certo, o problema do piso esburacado e das lombas, dos peões e das cabras, das bicicletas e dos controles militares, mas fora isso era maravilhoso.
Que sossego, que segurança.
Não admira que me tenha sentido muito seguro. É fácil quando cumprimos as regras, e as regras eram claras. Podíamos circular livremente dentro do hotel. Fora do perímetro do hotel, que estava estrategicamente implantado numa pequena ilha, teríamos de estar SEMPRE acompanhados pelos nossos guias locais.
A Coreia do Norte é fixe, mas nas minhas próximas férias vou para um país democrático. Para desenjoar!
- CARLOS ABRANTES