Por favor vire o ecrâ na vertical para visualizar o website

INICIAR SESSÃO

REGISTAR

REPOSITÓRIO

METEOROLOGIA

Sexta-feira

Data: 2022-01-28

Max: 18ºC

Min: 7ºC

Sábado

Data: 2022-01-29

Max: 18ºC

Min: 6ºC

Domingo

Data: 2022-01-30

Max: 22ºC

Min: 12ºC

ÚLTIMAS + LIDAS + PARTILHADAS HISTÓRICO DE NEWSLETTERSASSINATURA DIGITALINICIAR SESSÃOREGISTAR HISTÓRIA E ESTATUTO EDITORIAL POLITICA DE PRIVACIDADE / TERMOS DE USO FICHA TÉCNICA RELATÓRIO ANUAL DE GOVERNO SOCIETÁRIO
FECHAR

Odete Ferreira

CRÓNICA | Odete Ferreira | Eu vim de longe

2019-12-03 15:51:11

Foto SP

CRÓNICA | Odete Ferreira | Eu vim de longe

“Eu vim de longe,
De muito longe”
In “Portugal Solidário” José Mário Branco (1942 – 2019)

Eu vim de longe
de muito longe
o que eu andei p'raqui chegar
Eu vou p'ra longe
p'ra muito longe
onde nos vamos encontrar
com o que temos p'ra nos dar.

Sempre inquieto, José Mário Branco satirizou a sociedade dominada pela ditadura, solidarizou-se com os mais fracos, rebelou-se contra a hipocrisia e o encarceramento da liberdade e, do exílio, regressou a Portugal, a 28 de Abril de 1974.
Veio de longe, com uma “viola numa mão e uma flor vermelha n'outra mão” e o que ele andou p’raqui chegar! Com a sua poesia e a sua música, também se fez Abril. Mas José Mário Branco pressentiu e inquietou-se com o pesadelo de todo o mundo.
Deixou-nos há uns dia breves, que já nos parecem longos.
Foi breve, o sonho? Mas a brevidade é a essência do sonho. Foi bela e distante, a utopia? Mas nasceram-nos asas, por momentos,
Também eu cheguei a Águeda, numa tarde esplendorosa de um julho antigo, vinda “de longe, de muito longe”, de um continente vermelho, plantado de embondeiros, onde o longe se repetia, no horizonte, numa ânsia longa de infinito. Trazia um berço nos braços.
“O que eu andei
Para aqui chegar”
O que eu passei para fugir à guerra e salvar o berço. Em Águeda, acolheram-me a serra, a ponte e o rio. Foi um sonho lindo, que então começou.
Mas a guerra tem a idade do planeta. Ás vezes, adormece, ilusoriamente, para logo, se encarniçar, letal e mortífera.
Farid Walizadeh, menino afegão, perdeu-se da família, na guerra que há longos anos, vem assolando o seu país. Foi uma das crianças não acompanhadas, que fugiu da guerra, atravessando meio mundo até chegar à Turquia, e, finalmente ser acolhido, em Portugal, num Centro de Crianças Refugiadas (CACR).
“O que ele passou para cá chegar!”
Hoje, Farid é nosso campeão de boxe. Ele afirma-se, não apenas como campeão de um país, mas também campeão dos refugiados. Tem sonhos lindos. Reencontrar a sua família, viver com ela, aqui, onde ele encontrou a paz, ser campeão olímpico e ser arquiteto, para reconstruir um mundo destruído.
Mas, talvez neste preciso momento, num camião frigorífico, com destino incerto, um jovem escreva a última mensagem, para um país fantasma:
morro de frio, mãe!
Amo-te muito, mãe!
Lá longe, a mãe, cega de dor,
soluça em agonia.
Nunca mais volto a ver o meu
menino!
Veio de longe, p’ra outro longe, o menino de sua mãe. Trazia sonhos lindos. O que ele passou, p’ra nunca mais chegar!
- ODETE FERREIRA