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Foto SP
Vivemos numa espécie de suspensão do tempo sem tempo.
Tudo se move em torno dum universo coletivo como se o nosso Mundo deixasse de ser um lugar físico, natural, para passar a ser, um domínio cibernético, na internet, na videoconferência, no webinário (como dizem os brasileiros), uma espécie de Mundo global escondido.
Nem as relações, nem as amizades, as cumplicidades pessoais e profissionais, a sociedade em geral, mais ou menos alocada ao virtual, ninguém escapará à mudança trazida pela catástrofe em curso.
A realidade caiu com estrondo sobre os humanos, confrontando-os com as suas debilidades, as suas insuficiências, as suas limitações, face ao ataque brutal dum vírus mortífero que, com ou sem teorias da conspiração construídas sobre esse lugar distante da Ásia, mata sem aviso e deixa um rastro de destruição.
As administrações dos Estados, nacionais, regionais ou locais do mundo dito civilizado ou desenvolvido, não estavam preparadas para esta intifada viral que encontrou os quartéis vazios e as tropas desmobilizadas.
Para uns, a resposta do Estado na definição da “situação de emergência” foi tardia, e para outros desnecessária.
Mas para a maioria, foi a resposta possível no quadro das condições dum país que desde há muito tempo vive em situação de dívida externa crónica, com orçamentos remediados e políticas públicas de investimento descuradas, sobretudo nos sectores fundamentais da vida coletiva.
O sector da saúde, já de si débil desde o desinvestimento seletivo de que tem sido alvo no passado, não esperava um choque tão radical como o que está a viver.
Mas o seu maior capital de esperança revelou-se nos seus profissionais, médicos, enfermeiros, auxiliares e todos os que suspendem todos os dias as suas próprias vidas para salvar as vidas dos outros.
O tributo que temos que prestar a toda esta gente é incomensurável perante a grandeza da sua entrega.
E quem fala da saúde, fala das corporações de Bombeiros, da Cruz Vermelha Portuguesa, das Misericórdias, das igrejas, das IPSS's, das autarquias e de todas as instituições e economias locais que, sem exceção, colaboram no esforço nacional de contenção da epidemia.
Uma palavra também para o sector da Educação, cujos profissionais, e agentes educativos em geral, pais, professores, direções de agrupamentos escolares, escolas superiores, universidades, e todas as instituições de ensino públicas e privadas que se estão a reinventar com novas práticas pedagógicas e modelos que antes estavam adormecidos como o ensino à distância.
Os dias de quarentena em casa, em teletrabalho ou em reflexão, parecem longos e intermináveis, mas são uma porta aberta para um mundo novo, mais solidário, mais participativo e até mais democrático.
O que não se deseja é que este mundo tsunâmico possa ser aproveitado para uma escalada de abusos em tempo de crise, nas relações entre empregadores e trabalhadores, ou nas simples relações humanas em que, não raro, há imensa ingratidão perante a solidariedade ou a compaixão, seja do Estado, da sociedade em geral, ou dos outros humanos que, ricos ou pobres, sem ideologia ou credo, todos no mesmo plano de igualdade, vão percebendo mutuamente a efemeridade da vida e a inutilidade do confronto estéril, da vingança estúpida, da inveja e da má fé doentias.
Estiveram por isso muito bem os políticos que adotaram discursos colaborativos de Estado, colocando-se ao lado do Governo para somar esforços neste combate sem tréguas contra a morte, porque os Estados de exceção são para ultrapassar com políticos de exceção.
No entanto, quer a nível local, quer a nível nacional ou global, a cooperação de hoje, nunca substituirá, no momento próprio, o escrutínio e o contraditório da atuação atual e futura dos responsáveis perante esta crise que não passa sem dor (como diz o António Costa) e deixará sequelas graves.
A democracia ainda continua a ser o melhor dos regimes para ultrapassar as catástrofes silenciosas que não escolhem hora mas podem contribuir para reconciliar os humanos com o seu próprio destino. l PAULO MATOS